ABRH Brasil

Por Viviani Mansi*

O título é duro, eu sei. E acho que não há preto ou branco quando pensamos em nossa trajetória profissional – o que temos assistido (ou participado) é de uma discussão cada vez mais intensa sobre o papel e o espaço do trabalho em nossas vidas. Muitas vezes ele é absolutamente central, sendo que todo o resto – como amigos, família, lazer e outros prazeres da vida ficam em segundo plano.

Mas se você pensar na sua carreira, em que lado dessa conta você está? Mais que isso, se você ocupa uma posição de liderança, como você faz seu time se sentir?

Eu, felizmente, faço parte do grupo de pessoas que sempre encontrou no trabalho um campo pleno de realizações, mas não sem passar por uma crise ou outra de ansiedade ou de estresse. Parece natural na vida de todos nós. A questão é que, para algumas pessoas, esse período mais crítico é muito mais constante e, por isso mesmo, frustrante.

Um estudo publicado neste mês de novembro pelos pesquisadores Bruno Carramenha e Thatiana Cappellano, levanta alguns dados alarmantes sobre essa questão. Ele revela que para 78% das pessoas, o trabalho contribui ou já contribuiu para o seu sofrimento. Os resultados corroboram dados da Previdência Social, que aponta que os episódios depressivos são a décima causa de concessão de auxílio-doença, com 43,3 mil casos.

Com a orientação teórico-metodológica de Ruy Braga, chefe do Departamento de Sociologia da Universidade de São Paulo (USP) e o maior estudioso das relações de trabalho no Brasil, o estudo revela frustrações, angústias e medos que se manifestam no contexto do trabalho e acabam por deteriorar a saúde psíquica das pessoas. Os cinco principais são:

O trabalho é sempre violência
Neste achado, debate-se as manifestações de violência que o trabalho apresenta às pessoas desde a infância: do trabalho que afasta pais e filhos e mina relacionamentos às cobranças por arrumar um emprego ou abusos pela condição profissional.

O mercado não sabe o que quer
O segundo achado explora uma incoerência que internamente, nas organizações, se manifesta de maneira muito semelhante nos processos de promoção, percebidos como fraudulentos ou algo de fachada.

O sofrimento vem de cima
Aqui, fala-se sobre chefes que assediam, mas também muito sobre aqueles que simplesmente são omissos, mesmo frente a casos concretos de adoecimento psíquico.

Renda importa, acesso a saúde escraviza e o ócio liberta
A maior parte dos entrevistados afirmou concordar com condições degradantes de trabalho para garantir sua renda, em especial, para garantir o benefício do seguro saúde, no caso dos trabalhadores com vínculo empregatício formal. Ao mesmo tempo, pessoas que usufruem de tempo livre (seja pela desocupação ou jornada flexível) possuem outra perspectiva em relação ao trabalho.

O (não) futuro do (não) trabalho.
O quinto e último achado da pesquisa trata da ausência de consciência e reflexão acerca do impacto da perda de proteção social e de mudanças na configuração do trabalho tal qual o conhecemos decorrentes da automação e outras tecnologias.

A revista HSM Management, na sua edição #135, dedicou o dossiê (23 páginas) ao tema: saúde mental nas empresas. Pesquisas como a da Organização Mundial da Saúde dizem que a cada U$ 1 dólar investido na saúde mental dos trabalhadores, o retorno é de U$ 4 dólares, considerando melhores condições e capacidade de trabalho.

Diante de tudo isso, cabe nossa reflexão: em que medida contribuímos para esses dores? E, mais importante que isso, quais estratégias podemos adotar para evita-las? Os especialistas consultados pela HSM são categóricos: não adianta apenas apostar em soluções superficiais como aulas de yoga ou massagem. As discussões precisam ser mais profundas e estar conectadas às estratégias de gestão de pessoas e crescimento da empresa.

Como tudo que temos visto atualmente, não bastam ações isoladas. Precisamos refletir mais profundamente no nosso impacto no outro. Não cabe somente a profissionais, mas a todos nós: pais e mães, colegas, cidadãos.

Serviço

Trabalho e Sofrimento Psíquico: Histórias que Contam essa História
Autores: Thatiana Cappellano e Bruno Carramenha
Ilustrações: André Dahmer
Prefácio: Ruy Braga
Editora Haikai
Grátis em plataforma digital (www.4co.com.br)
HSM Management – edição 135
https://www.revistahsm.com.br/editions

*Viviane Mansi é diretora da ABRH, especialista em diálogo, docente e executiva na Toyota. Publica regularmente no Linkedin.